Doenças da visão | Entrevista

Conheça a anatomia do olho e as principais doenças que afetam a visão, como miopia, hipermetropia, entre outras.

Dra. Amaryllis Avakian é médica oftalmologista, responsável pelo setor de cataratas do Departamento de Oftalmologia do Hospital das Clínicas da USP. postou em Entrevistas

Na entrevista, conheça a anatomia do olho e saiba quais são as principais doenças da visão.

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Publicado em: 18 de janeiro de 2012

Revisado em: 11 de junho de 2021

Na entrevista, conheça a anatomia do olho e saiba quais são as principais doenças da visão.

 

Os olhos são órgãos fundamentais para apreendermos o universo em que estamos inseridos. Na verdade, eles funcionam como uma câmara fotográfica constituída por lentes que captam a imagem e a conduzem ao cérebro, onde realmente se processa a visão, um dos sentidos que dão suporte ao processo de comunicação.

Para que o olho cumpra seu papel é preciso que haja luz. Entretanto, isso não basta se existirem alguns defeitos de visão. Por exemplo, pessoas com hipermetropia enxergam mal de perto. Nos míopes, é a visão de longe que está comprometida e quem tem astigmatismo vê tudo embaçado.

Os óculos nada mais são do que lentes criadas para corrigir esses defeitos. Se a imagem formar-se antes da retina, uma lente divergente irá fazê-la cair no ponto certo. Na hipermetropia, a lente precisa ser convergente e o astigmatismo exige um tipo de lente especial para a pessoa enxergar com nitidez. Quando a idade vem chegando, então, quase ninguém dispensa os óculos para ler ou executar uma tarefa que exija acuidade visual.

 

ANATOMIA DO OLHO

 

Drauzio – Quais são os principais elementos do olho normal?

Amaryllis Avakian – O olho é constituído pela córnea, membrana fina e transparente, semelhante a um vidro de relógio, que recobre toda a frente do globo ocular e através da qual se pode ver a íris, a parte colorida do olho. No centro da íris está a pupila, um pequeno orifício que permite a entrada da luz. (imagem 1)

Imediatamente atrás da pupila, fica o cristalino (estrutura esbranquiçada na imagem 1), uma lente por onde passam os raios luminosos provenientes do exterior.

 

Drauzio – O cristalino não é a única lente que existe no olho. Qual é a outra?

Amaryllis Avakian – No olho, existem duas lentes principais que fazem a convergência da luz: a córnea e o cristalino. Quando olhamos um objeto à distância, os raios de luz que partem dele, chegam aos nossos olhos em linhas paralelas. Para que sejam focalizados na retina, precisam convergir e isso ocorre nessas duas lentes. Ainda na (imagem 1), representada pela cor de tijolo, está a retina, onde se localizam os receptores fotossensíveis.

Quando a luz que passou pela córnea e pelo cristalino chega à retina, as informações são transmitidas pelo nervo ótico ao cérebro. Na verdade, é com o cérebro que enxergamos. O olho é uma estrutura por onde passa a luz. Ele forma a imagem e transmite os impulsos nervosos para o córtex occipital, que fica na parte de trás do cérebro. É nele que se processa a visão.

 

Drauzio – Embora seja estranho pensar que não são os olhos, mas é o cérebro que decodifica a imagem dos objetos que estão diante de nós, há provas incontestáveis de que isso acontece. Basta lembrar que uma pessoa perderá parcial ou completamente a capacidade de enxergar se, num acidente, comprometer o lobo occipital onde se localiza o centro da visão, mesmo que seus olhos permaneçam íntegros.

Amaryllis Avakian – No recém-nascido, o olho é só uma estrutura do organismo. Se a criança tiver qualquer defeito visual, por exemplo, catarata, ou se a pálpebra não abrir impedindo que a luz entre no olho, o cérebro não será estimulado e a criança não terá visão nesse olho.

Vale repetir que o olho, em si, é apenas um órgão que permite a passagem da luz e sua transmissão até o cérebro, onde se processa a informação visual.

 

Drauzio – Resumindo, como funciona o olho normal?

Amaryllis Avakian – A luz incide em raios paralelos na superfície anterior do olho, que se chama córnea. Na córnea, começa a convergência dos raios luminosos, que continua no cristalino. No olho normal (imagem 2), eles caem exatamente sobre a retina, onde estão os receptores fotossensíveis, e são transformados em ondas elétricas que serão conduzidas pelo nervo ótico até o cérebro.

 

MIOPIA

 

Drauzio- O que é miopia?

Amaryllis Avakian – Miopia é um defeito da visão em que, por aumento da convergência da córnea ou do cristalino ou porque o tamanho do olho é um pouco maior do que o padrão habitual, a convergência acaba ocorrendo antes da retina e por isso a visão fica embaçada (imagem 3).

 

Drauzio – Quais são as principais características da visão do míope?

Amaryllis Avakian – Miopia é um defeito da visão que pode ocorrer em qualquer idade. A pessoa míope tem dificuldade para ver de longe, mas enxerga bem de perto.

 

Drauzio – É interessante notar que muitos idosos míopes tiram os óculos quando vão ler. Por que isso acontece?

Amaryllis Avakian – Toda pessoa míope enxerga bem de perto sem óculos. Os míopes só têm dificuldade para a visão à distância. No caso dos idosos que não tinham miopia e de repente começam a não precisar de óculos para a leitura, em geral, há outros problemas envolvidos. Com a idade, a catarata começa a manifestar-se, o que aumenta a convergência da luz no cristalino, induzindo a miopia. Por isso, muitos idosos com catarata dizem estar surpresos com a melhora da visão para perto.

No entanto, para enxergar objetos situados à distância, a dificuldade aumenta. Acontece que, muitas vezes, eles nem percebem o problema, porque a vida do idoso acaba ficando mais circunscrita a atividades por perto.

 

Drauzio – A que distância começam os problemas de visão para a pessoa míope?

Amaryllis Avakian – Tudo depende do grau de miopia que ela tiver. Quanto maior a miopia, menor a distância que ela consegue ver com nitidez sem óculos. Em geral, ninguém  nasce com esse distúrbio. Recém-nascidos, por exemplo, raramente têm miopia. Se têm, o defeito é pouco grave, mas tende a aumentar de grau com o crescimento do olho.

 

Drauzio – Em que idade, geralmente, aparece a miopia?

Amaryllis Avakian – Isso varia de pessoa para pessoa, mas a miopia costuma aparecer na idade escolar ou na adolescência. O recém-nascido apresenta hipermetropia, que vai reduzindo com o crescimento  do globo ocular. Às vezes, o grau de hipermetropia é zerado com esse crescimento. No entanto, quando o olho cresce um pouco mais, um quadro de miopia começa a desenvolver-se.

 

HIPERMETROPIA E PRESBIOPIA

 

Drauzio – Como você caracteriza a hipermetropia?

Amaryllis Avakian – Na hipermetropia (imagem 4), a convergência final dos raios de luz, que penetram pela córnea, acaba ocorrendo num ponto atrás de retina. O resultado é o oposto da miopia: a pessoa enxerga mal de perto e bem de longe.

A hipermetropia é uma característica dos olhos pequenos. Em geral, toda criança nasce com 20° de hipermetropia, mas o olho vai crescendo e o grau, diminuindo.

Dependendo do grau, a hipermetropia é considerada normal até os quatro ou cinco anos e não há necessidade de lentes para corrigi-la.

 

Drauzio – A incidência de hipermetropia é mais ou menos comum a partir de certa idade?

Amaryllis Avakian – A hipermetropia é comum ao nascimento. Depois, a partir dos 40 anos, existe um tipo de hipermetropia, chamado de presbiopia, que é vulgarmente conhecido como vista cansada. Por causa dele, pessoas que tinham visão normal até essa idade precisam de óculos para enxergar de perto.

 

Drauzio – Qual a diferença entre hipermetropia e presbiopia, ou seja, a vista cansada das pessoas mais velhas?

Amaryllis Avakian – A diferença está só na nomenclatura. Chamamos de hipermetropia o defeito de visão que aparece antes dos 40 anos e de presbiopia, ou vista cansada, o que aparece depois dessa idade. Em geral, depois dos 40 anos, a maior parte das pessoas precisa de óculos para leitura. Nessa fase, porém, os míopes são privilegiados, porque um defeito compensa o outro. Resultado: eles tiram os óculos que corrigem a visão para longe, quando vão ler, pois conseguem enxergar com nitidez de perto.

 

Drauzio – Você disse que toda criança nasce com hipermetropia. Como evolui a hipermetropia a partir do nascimento?

Amaryllis Avakian – Todos nós nascemos com um grau maior ou menor de hipermetropia. É como se tivéssemos um olho pequeno que faz os raios caírem atrás da retina. No recém-nascido, a hipermetropia gira em torno de 20°. Com o crescimento, esse grau vai sendo reduzido até atingir o momento em que deve zerar. No entanto, se o olho continuar crescendo, a criança desenvolverá miopia.

 

Drauzio – O recém-nascido, então, enxerga mal de perto. Tem dificuldade para focalizar o rosto da mãe. Com que idade, seu olho adquire o tamanho ideal para a imagem cair exatamente sobre a retina?

Amaryllis Avakian – Por volta dos cinco ou seis anos, a hipermetropia já é bem pequena, embora até os 40 anos a pessoa tenha um grau de hipermetropia residual, imperceptível, e que dispensa o uso de óculos.

Apesar de testes visuais em crianças pequenas mostrarem que a visão só se completa um pouco mais tarde, a partir de um ano, elas já estão vendo muito bem de perto, porém essa capacidade adquirida não é estável. Uma doença ou acidente que interfiram na estrutura do olho podem fazê-la regredir totalmente.

 

Drauzio – O hipermétrope forma a imagem atrás da retina. Esse é um defeito visual que pode ocorrer antes dos 40 anos. Já, depois dos 40, são muito comuns os casos de presbiopia, ou vista cansada. A associação de hipermetropia com presbiopia agrava o quadro?

Amaryllis Avakian – Agrava. Se a pessoa tinha, por exemplo, três graus de hipermetropia antes dos 40 anos, depois dos 40, poderá precisar de óculos multifocais ou de lentes progressivas.

 

Drauzio – Miopia e hipermetropia são defeitos antagônicos. Eles podem aparecer junto?

Amaryllis Avakian – Eles nunca aparecem juntos no mesmo olho. Isso não impede que a pessoa possa apresentar miopia num olho e hipermetropia no outro.

 

Drauzio – Existem estatísticas sobre a incidência de hipermetropia, miopia e astigmatismo na população em geral?

Amaryllis Avakian – Não temos estatísticas oficiais, mas existem algumas estimativas que somos capazes de levantar de acordo com a faixa etária. Praticamente, 100% das pessoas são hipermétropes quando nascem. Já os míopes são raros nessa idade. Aos sete anos, aproximadamente 70% das crianças são hipermétropes e os 30% restantes, míopes. Quanto ao astigmatismo, é difícil calcular, porque a pessoa pode ter astigmatismo e miopia ou astigmatismo e hipermetropia, simultaneamente.

 

ASTIGMATISMO

 

Drauzio – O que caracteriza o astigmatismo?

Amaryllis Avakian – O astigmatismo é determinado por uma diferença entre a curvatura da porção vertical e a curvatura da porção horizontal da superfície anterior do olho, ou seja, da córnea. Pensando bem, a maioria das pessoas tem um certo grau de astigmatismo assintomático, porque a córnea é ovalada, parecida com uma bola de futebol americano.

Às vezes, porém, as alterações na curvatura do olho características do astigmatismo são provocadas por acidentes ou doenças. Por exemplo, num acidente, a pessoa pode perfurar o olho. Desse corte, deriva uma cicatriz irregular, de difícil correção com óculos a ponto de haver necessidade de um transplante de córnea.

 

ÓCULOS

 

Drauzio – Os óculos nada mais são do que lentes que ajudam a corrigir defeitos da visão, mas estão cercados de mitos. Por exemplo, são muitos os que adiam o momento de usá-los, porque imaginam que aceleram a piora da visão. Isso é verdade?

Amaryllis Avakian – Os óculos não viciam. Acontece que a pessoa acaba acostumando com a melhor visão que eles proporcionam e procura usá-los sempre. Antes, talvez nem percebesse que estava enxergando mal, porque o comprometimento da visão ocorreu lentamente. O fato é que a pessoa se acostuma com a visão nítida que os óculos proporcionam e passa a rejeitar a visão embaçada que tem sem os óculos.

 

PERGUNTAS ENVIADAS POR E-MAIL

 

Mônica Britz  – Joinvile (SC) – Por serem doenças nos olhos, quais os riscos de um portador desses defeitos ficar cego?

Amaryllis Avakian – Raramente alguém fica cego por um desses problemas. O que mais está relacionado com a perda da visão é a miopia por causa de alterações associadas, internas do olho, principalmente da retina, que é muito fina nos míopes. Para entendermos a razão, basta pensar que o olho míope é maior do que o normal e que para cobri-lo a retina fica mais esticada, mais fina e mais sujeita a formar buracos que podem provocar seu descolamento e, como consequência, cegueira. Existem, ainda, miopias que aumentam progressivamente até atingir 20°, 25°. São chamadas miopias malignas, que não causam cegueira, mas provocam perda acentuada da qualidade da visão.

 

Letícia Martins – Belo Horizonte (MG) –O portador de astigmatismo está fadado a ter dor de cabeça?

Amaryllis Avakian – O astigmatismo provoca mais sintomas do que a miopia e a hipermetropia. A dor de cabeça é um deles. No entanto, o uso de óculos ou de lentes de contato evita que a dor de cabeça se manifeste.

 

Marcos Carvalho – São Caetano (SP) – Qual a idade ideal para a cirurgia corretiva?

Amaryllis Avakian – O objetivo primeiro da cirurgia de miopia ou de hipermetropia é reduzir a necessidade de usar óculos. No entanto, dependendo do grau, não haverá correção completa nem mesmo com cirurgia, que é indicada para casos de miopia até por volta de 8°, de hipermetropia até 4° e para alguns tipos de astigmatismo.

Para realizar a cirurgia corretiva, a condição básica é que o grau esteja estabilizado, o que acontece, em geral, ao redor dos 21anos. Antes disso, ela não deve ser feita.

Muita gente nos procura preocupada com o aumento constante e progressivo do grau e pergunta se a cirurgia não interromperia o processo. Não interrompe, o grau continuará aumentando, tenha ela sido feita ou não.

 

Drauzio – Esse é um conceito muito importante: a cirurgia não deve ser feita antes dos 21 anos nem quando o defeito está se agravando.

Amaryllis Avakian – Existem outras condições do olho em si que também impedem a cirurgia. Na córnea, a parte anterior do olho onde a cirurgia é realizada, há alguns parâmetros que devem ser observados, principalmente os de curvatura e de espessura. Por exemplo, se a pessoa tiver 8°de miopia e a espessura da córnea for muito fina, é provável que o defeito não seja corrigido totalmente. Por outro lado, se houver alteração da curvatura como a provocada pelo ceratocone – doença em que a córnea adquire o formato de um cone – ou qualquer outra doença da superfície do olho, a cirurgia não pode ser realizada sob pena de agravar o defeito. Em casos como esses, o mais indicado costuma ser o transplante de córnea.

 

Drauzio – Há detalhes técnicos que devem ser muito bem analisados, porque a cirurgia não está indicada para todos os defeitos oculares.

Amaryllis Avakian – É fundamental deixar claro que a cirurgia não pode ser indicada para todas as pessoas e que apenas parte do grau será corrigida.

 

Silvana Ramires – São Paulo (SP) – A cirurgia corretiva tem prazo de validade? Durante quanto tempo, o olho funciona bem?

Amaryllis Avakian – O primeiro aspecto a considerar é se a cirurgia será realizada antes dos 40 anos, fase em que a pessoa costuma ter um defeito só: miopia ou hipermetropia. Nesse caso, é possível zerar o grau e enxergar bem sem óculos. Porém, depois dos 40 anos, provavelmente surgirá o problema da vista cansada e o uso dos óculos para a leitura será necessário novamente.

A validade da cirurgia existe, enquanto nenhuma outra doença aparecer nos olhos, por exemplo, catarata, glaucoma, problemas de retina, etc.

 

Drauzio – Cirurgia para vista cansada é ainda um ponto controverso na oftalmologia…

Amaryllis Avakian – O tratamento para vista cansada com laser é controverso. O que existe hoje de mais estabelecido é, nos pacientes que tem catarata, utilizarmos uma lente intraocular que corrija a visão para perto e para longe simultaneamente.

 

Sites:

  1. www.especialistaemcatarata.com.br
  2. www.aaco.com.br

Edição revista e atualizada em 09/09/2015

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