Janelas quebradas | Artigo

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Publicado em: 26 de abril de 2011

Revisado em: 11 de agosto de 2020

A mensagem é clara: desordem e sujeira nas ruas mais do que duplicam o número de pessoas que joga lixo na sarjeta e rouba.

 

A deterioração da paisagem urbana é lida como ausência dos poderes públicos, portanto enfraquece os controles impostos pela comunidade, aumenta a insegurança coletiva e convida à prática de crimes.

Essa tese, defendida pela primeira vez em 1982 pelos americanos James Wilson e George Kelling, recebeu o nome de “teoria das janelas quebradas”.

Segundo ela, a presença de lixo nas ruas e de grafite sujo nas paredes provoca mais desordem, induz ao vandalismo e aos pequenos crimes. Com base nessas ideias, a cidade de Nova York iniciou, nos anos 1990, uma campanha para remover os grafites do metrô, que resultou numa diminuição dos crimes realizados em suas dependências. O sucesso da iniciativa serviu de base para a política de “tolerância zero” posta em prática a seguir.

 

Veja também: Entrevista sobre violência urbana e saúde pública

 

Medidas semelhantes foram adotadas em diversas cidades dos Estados Unidos, Inglaterra, Holanda, Indonésia e África do Sul. Mas, apesar da popularidade, a teoria das janelas quebradas gerou controvérsias nos meios acadêmicos, por falta de dados empíricos capazes de comprová-la.

Um grupo de holandeses da Universidade de Groningen publicou um estudo na revista “Science”, que esclarece os pontos obscuros da teoria.

O primeiro experimento foi conduzido num estacionamento para bicicletas, numa área de compras da cidade de Groningen. Para simular ordem, os pesquisadores limparam a área e colocaram um aviso bem visível de que era proibido grafitar. Para a desordem, grafitaram as paredes da mesma área, apesar do aviso para não fazê-lo. A grafitagem constava apenas de rabiscos mal feitos, para evitar confusão com arte. Em ambas situações, penduraram um panfleto inútil nos guidões das bicicletas, de modo que precisasse ser retirado pelo ciclista antes de partir. Não havia lixeiras no local. Na situação ordeira, sem grafite, 77% dos ciclistas levaram o panfleto embora. Na presença do grafite, apenas 31% o fizeram; os demais jogaram-no no chão.

Uma segunda experiência foi realizada no estacionamento de um supermercado. No portão em que as pessoas normalmente entravam para buscar o carro, foi colocada uma cerca com uma abertura de 50 cm. Nela, foram afixados um aviso para andar 200 metros a fim de alcançar um portão alternativo e outro que proibia amarrar bicicletas na cerca.

Na condição de ordem, quatro bicicletas foram estacionadas a um metro da cerca; na de desordem, as quatro foram acorrentadas a ela. Na ordem, 27% das pessoas entraram pelo portão proibido; na desordem, 82%.

No terceiro estudo, também conduzido no estacionamento de um supermercado, foi colocado um aviso para devolver o carrinho de compras num determinado lugar, depois de descarregá-lo no porta-malas. Ao mesmo tempo, foram pendurados os panfletos inúteis na parte externa do para-brisa.

Para simular ordem, nenhum carrinho foi deixado à vista; na situação de desordem, quatro deles ficaram expostos. Quando havia ordem, 30% dos motoristas atiraram o panfleto no chão, atitude tomada por 58% dos que encontraram os carrinhos abandonados.

O quarto estudo se baseou numa lei holandesa que proíbe fogos de artifício nas semanas que antecedem o ano-novo, contravenção punida com multa de 60 euros.

O cenário foi um abrigo de bicicletas junto a uma estação de trens. O mesmo panfleto dos experimentos anteriores foi pendurado nos guidões. A situação de desordem foi representada pelo espoucar distante dos fogos no momento em que o ciclista chegava para retirar a bicicleta; a de ordem, pelo silêncio. No silêncio, 52% jogaram os panfletos na rua; ao ouvir os fogos proibidos o número aumentou para 80%.

Nos estudos cinco e seis, foi testada a tentação para roubar. Numa caixa de correio da rua, foi colocado um envelope parcialmente preso à boca da caixa (como se tivesse deixado de cair para dentro dela), com uma nota de 5 euros em seu interior, bem visível para os transeuntes.

Na situação ordeira, a caixa estava sem grafite e sem lixo em volta. Numa das condições de desordem estava grafitada; na outra, sem grafite, mas com lixo ao redor.

Dos transeuntes que passaram diante da caixa sem grafite nem lixo, 13% roubaram o dinheiro. Esse número aumentou para 27% quando havia grafite e para 25%, quando havia apenas lixo ao redor.

A mensagem é clara: desordem e sujeira nas ruas mais do que duplicam o número de pessoas que joga lixo na sarjeta e rouba.

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