Erradicação da poliomielite | Artigo

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Publicado em: 25 de abril de 2011

Revisado em: 11 de agosto de 2020

Um programa regional de erradicação da poliomielite foi iniciado nas Américas em 1985, com base na criação dos dias nacionais de vacinação para crianças com menos de cinco anos. 

 

A vacina Sabin contra a poliomielite foi um marco na história da humanidade.

Existem duas vacinas contra a poliomielite: a vacina Salk, que emprega vírus mortos administrados por via injetável, e a Sabin, preparada com vírus vivos atenuados, passíveis de administração oral.

Introduzida em 1962, a vacina Sabin mostrou-se mais eficaz nas campanhas de vacinação em massa pela comodidade da via oral e pelo fato de o vírus atenuado nela contido ser excretado nas fezes, podendo conferir imunidade aos não-vacinados que entrem em contato com ele nas regiões de saneamento precário.

 

Veja também: Artigo do dr. Drauzio sobre descoberta da vacina da poliomielite

 

Um programa regional de erradicação da poliomielite foi iniciado nas Américas em 1985, com base na criação dos dias nacionais de vacinação para crianças com menos de cinco anos e na supervisão médica de todos os casos de paralisia aguda em menores de 15 anos, com a finalidade de detectar novos surtos.

Como consequência, o último diagnóstico de pólio no Brasil foi feito em 1990, e o último caso endêmico ocorreu no Peru, em 1991. Oficialmente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a poliomielite erradicada das Américas em 1994 e da Europa em 1999.

Esses resultados motivaram a OMS a lançar, em 1988, um programa de erradicação global, com o objetivo de pôr um fim à doença até o ano 2000.

A pretensão era razoável: se em 1977 havíamos varrido a varíola da face da Terra, por que não conseguiríamos o mesmo com uma doença para a qual existe vacina e que é transmitida de homem para homem sem a intermediação de hospedeiros intermediários, que tantas vezes funcionam como reservatórios naturais impossíveis de eliminar?

O tempo se encarregou de deixar claro que a varíola foi mais fácil de eliminar. Primeiro, porque seus portadores são facilmente identificáveis a partir das lesões que surgem na pele, enquanto a maioria das infecções pelo vírus da pólio são inaparentes: apenas um em cada cem a 200 infectados desenvolve a forma paralítica da doença, mas todos eliminam o vírus nas fezes. Segundo, porque enquanto uma única dose da vacina contra a varíola confere imunidade em 95% a 98% das vacinações, a da paralisia infantil exige três, quatro e, às vezes, seis doses de reforço para a imunização.

Além disso, em 1977, quando ocorreu o último caso de varíola, a população mundial era de 4 bilhões, contra os 6,2 bilhões atuais, aumento ocorrido quase exclusivamente em países que dispõem de poucos recursos para investir em saúde.

Quando o programa da OMS de erradicação da pólio foi iniciado em 1988, havia 350 mil casos de paralisia infantil no mundo.

Em 2005, esse número havia diminuído para 2.000, queda impressionante, mas aquém do objetivo inicial.

Problemas sociais e políticos explicam por que os US$ 4 bilhões investidos não foram suficientes para acabar com a doença em regiões conflagradas, como Somália, Congo, Angola e a fronteira entre Afeganistão e Paquistão. O caso da Nigéria é didático. Em 2003, grupos que se opõem à vacinação de crianças (que por incrível que pareça ainda existem) lançaram boatos de que a vacina estaria contaminada pelo vírus da Aids ou misturada com hormônios destinados a esterilizar meninas muçulmanas, e conseguiram suspender a vacinação em vários Estados no norte do país. Resultado: um ano mais tarde, o número de casos havia chegado a 800, o dobro do ano anterior, e o vírus invadiu países vizinhos como Iêmen e Somália.

Ao lado dessas dificuldades, há evidências de que o vírus da pólio possa se espalhar por vários anos sem ser detectado.

Em 2005, pesquisadores demonstraram a presença silenciosa do vírus durante cinco anos no Sudão, enquanto a OMS considerava o país como área livre da doença. A poliomielite ainda persistirá por muitos anos?

Isao Arita, pesquisador que participou com distinção das campanhas contra a varíola, considera mais realista admitirmos que a estratégia de erradicação deve ser substituída pela de “controle efetivo”. Segundo ele, a prioridade é manter as medidas de emergência atuais para limitar a disseminação do vírus na África, Oriente Próximo, Índia e Indonésia.

Ficaremos livres de vacinar nossos filhos contra a poliomielite, como aconteceu com a vacinação anti-variólica? Tão cedo, não. Mesmo depois de surgir o último caso, será difícil garantir que o vírus tenha de fato desaparecido. Um retorno dele num mundo de crianças não-imunizadas provocaria uma tragédia.

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