Estudo mostra que os avanços na prevenção, no rastreio e no tratamento de cinco tipos de câncer evitaram milhões de mortes nos últimos 45 anos. Leia na coluna de Mariana Varella.
Os tratamentos oncológicos avançaram muito nas últimas décadas. Cânceres que antes eram responsáveis pela morte de milhares de pessoas todos os anos, hoje podem ser tratados e até curados com tratamentos avançados e disponíveis em boa parte do mundo.
Além do tratamento, a medicina também avançou na prevenção e na detecção precoce de determinados tipos de cânceres, mudando o cenário da oncologia.
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Um estudo publicado no dia 4 na revista científica “Jama Oncology” calculou as mortes que poderiam ter sido causadas por cinco tipos de cânceres: mama, colo do útero, colorretal, pulmão e próstata.
De acordo com os autores, que utilizaram modelos estatísticos e dados de mortalidade por câncer nos Estados Unidos entre 1975 e 2020, as mortes foram evitadas pela combinação de avanços na prevenção, rastreio e tratamento desses cânceres.
Conduzido por pesquisadores do National Institutes of Health (NIH), nos Estados Unidos, o estudo analisou as mortes provocadas por esses tipos específicos de câncer porque todos contam com estratégias para prevenção, detecção precoce e tratamento.
No total, o modelo mostrou que 5,94 milhões de mortes que poderiam ter sido causadas por essas doenças deixaram de ocorrer no período. As intervenções de prevenção e rastreio foram responsáveis por 4,75 milhões, ou 80%, das mortes evitadas.
“Embora muitas pessoas possam acreditar que os avanços no tratamento são o principal impulsionador da redução da mortalidade por esses cinco cânceres combinados, a surpresa aqui é o quanto a prevenção e o rastreio contribuem para a redução da mortalidade”, disse a co-investigadora Katrina A. B. Goddard, diretora da Divisão de Controle do Câncer e Ciências Populacionais do Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos (NCI). “Oito em cada dez mortes evitadas e que seriam causadas por esses cinco cânceres nos últimos 45 anos deixaram de ocorrer devido a avanços na prevenção e rastreio.”
Prevenção é fundamental
Uma única intervenção contribuiu para evitar a maior parte das mortes que teriam sido provocadas por esses cânceres: parar de fumar. Só em relação ao câncer de pulmão, deixar o cigarro preveniu cerca de 3,4 milhões de mortes nos 45 anos analisados.
A prevenção e o rastreio foram responsáveis por reduzir as mortes por câncer de colo do útero, pulmão, colorretal e próstata; já os avanços no tratamento evitaram a maioria das mortes que deixaram de acontecer devido ao câncer de mama.
As intervenções responsáveis por prevenir mortes no período estudado variam de acordo com o tipo de câncer, sendo:
- Câncer de mama: das 2,7 milhões de mortes que teriam ocorrido devido à doença na ausência de todas as intervenções no período, os avanços no tratamento foram responsáveis por evitar 3/4, enquanto a mamografia foi responsável pelo outro terço.
- Câncer de pulmão: os esforços para acabar com o tabagismo contribuíram para evitar 98% das 3,4 milhões de mortes que deixaram de ocorrer pela doença no período analisado. Os avanços no tratamento foram responsáveis pelos outros 2%.
- Câncer colorretal: das 940 mil mortes evitadas, 79% foram devidas ao rastreamento e à remoção de pólipos pré-cancerígenos. Os avanços no tratamento da doença evitaram os outros 21%.
- Câncer de próstata: das 360 mil mortes evitadas no período, o rastreamento através do exame de PSA contribuiu para prevenir 56% dessas mortes e os avanços no tratamento, 44%.
Os pesquisadores alertaram que, durante o período estudado, a vacina contra o HPV e o rastreio para câncer de pulmão não eram amplamente utilizados. Segundo eles, as intervenções poderiam ter contribuído por reduzir ainda mais as mortes por câncer.
De fato, a vacina contra o HPV, que preveni contra a maioria dos casos de câncer de colo do útero, só começou a ser utilizada nos Estados Unidos em 2006.
Desigualdade no acesso
Os resultados do estudo foram baseados em médias populacionais dos Estados Unidos, podendo não ser estendidos para outras populações específicas, principalmente se considerarmos as desigualdades de acesso às três intervenções: prevenção, rastreio e tratamento.
Em relação à prevenção, países cuja maioria da população tem dificuldade em adotar um estilo de vida mais saudável têm visto a taxa de câncer aumentar nos últimos anos. Somado ao envelhecimento populacional – o risco de câncer aumenta com a idade -, um estilo de vida sedentário, com alto consumo de álcool e alimentos ultraprocessados também está relacionado a vários tipos de câncer.
Outros fatores de risco para o câncer, como obesidade, tabagismo, alimentação pobre em verduras, frutas e grãos e rica em gorduras e ultraprocessados e sedentarismo estão relacionados, de acordo com várias pesquisas, a baixo nível educacional e socioeconômico, o que torna a prevenção privilégio de poucos.
O rastreio também não é acessível a todos e sequer é consenso entre as sociedades médicas, que discordam quanto à idade de início dos exames. Isso porque exames de rastreio, quando aplicados à população geral, podem levar a eventuais danos, como resultados falso-positivos e biópsias desnecessárias.
Os tratamentos oncológicos continuam avançando, mas estão longe de ser acessíveis. Muito dispendiosos, são poucos os países que conseguem ofertá-los à maioria dos pacientes.
Assim, faz sentido investir em prevenção, considerando que a expectativa de vida da maioria dos países ocidentais vem aumentando.
O que fazer para prevenir?
- Não fume. O tabagismo é responsável por cerca de 30% de todos os cânceres;
- Evite beber. O álcool está relacionado a mais de 60 doenças, entre elas vários tipos de câncer, e qualquer quantidade da substância eleva o risco da doença;
- Mantenha o peso. A obesidade aumenta o risco de câncer;
- Pratique atividade física regularmente. Exercícios físicos reduzem o risco de vários tipos de câncer, enquanto o sedentarismo eleva esse risco;
- Mantenha uma dieta equilibrada. Uma alimentação rica em frutas, verduras e grãos protege contra a doença, enquanto o consumo de produtos ultraprocessados está relacionado ao aumento do risco de câncer;
- Converse com seu médico sobre os exames de rastreio e vacinas que podem beneficiá-lo. A prevenção e o rastreio individualizados, que consideram fatores como idade e histórico familiar, são o melhor caminho para prevenir e detectar precocemente uma série de tumores.